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por Nilton Marlúcio Arruda De todas as lembranças dessa vida sexagenária que comigo trago, a que mais estrago é a do menino que nunca apressava as horas. Sorria através dos olhos claros e esperançava o tempo futuro, como quem trazia a certeza de fases melhores. Falo do menino que fui e que não flui mais em mim, corpo cansado. E, agora, minuto a minuto que passo comigo, tudo o que faço é me negar a olhar para frente, numa mente incapaz de resgatar o que ficou para trás sem ter passado. Parado no tempo, não volto nem sigo. E já não consigo espremer de mim o que tanto acreditava. Quando as horas nunca apontavam para o fim, tudo era caminho - por percorrer - e brancas folhas – por escrever.
Dei por desanimar…de tudo. E nem sei desde quando. Olho para as horas e tudo o que vejo são ponteiros em queda. De quebra, até o galho seco desertou as flores somente para tentar suportar a falência do tempo a se dissolver entre os seus marcadores. De resto, não há sequer paisagem se não uma passagem interrompida pelo cansaço das horas. Já nem sei se quero ir embora. Para onde, se na paralisia de cada estação perde-se o sol e as flores e as folhas e os frutos? Se tudo é neve fora de época, como se esquecer desse aquecimento em vida que chega nunca? E nesse frio persistente dos dias, já faço do relógio derretido o meu esconderijo predileto do tempo. Uma espécie de templo em caverna sagrada, só para ver se me profano de vez. Em quantos panos e tecidos tracei os meus planos que parecem ter se descosturado com o passar das horas? E quantas senhoras enganei com as minhas tantas promessas que deixei pelo caminho? Estou sozinho? Claro que não. Há aqui e acolá moscas e vespas a me formigarem a pele anestesiada. E nem posso reclamar da insensibilidade desses insetos se, em certo ponto, já me apontam para o desânimo dos indicadores temporais. Nada mais me faz acordar, então. É que tudo parece incerto para mim. Assim, todas as minhas certezas perderam o gabarito. Todos os meus gritos pereceram... em vão. Todo o meu chão virou detritos. Todos os meus ritos perderam o brilho e todos os trilhos só me levaram ao muro. Devo pular ou ficar? Do lado de lá: (in)certezas e silêncio. Uma esperança movediça em areia, feito vida em atalhos… E nesses retalhos que não vesti, já me vi a escalar, fosso a dentro, o que não faço...ideia de mim. Diante dos estragos dessas horas ressecadas em relógios deformados, deixo de lado as minhas invencionices e mergulho profundo à espera do nada, numa estrada que custa a passar pelo que nem pavimentei. E agora sei que até as horas se cansaram dessa minha demora em acordar o menino que em vida adormeci. Your comment will be posted after it is approved.
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Desafios de escrita criativa
Este é o espaço onde publicamos os textos dos membros do Clube de Escritores. Histórico
Novembro 2022
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4/11/2022
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