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Clara, a clarividente
“Clara, a clarividente”. Tinha esse epíteto desde a mais tenra idade e tal devia-se ao dom com que tinha sido agraciada: Clara sabia ler os pensamentos dos outros e isso acontecia desde que se lembrava de ser gente. Em criança usava o dom (que se pensava ter herdado da avó Joana, a sensata) a seu belo prazer, quando lhe apetecia. Usava-o para surpreender os coleguinhas, para provar que era uma feiticeira com poderes mágicos. Sabia ler a mente dos colegas, sabia o que pensavam, sabia os medos que tentavam esconder. Bastava fixar os olhos nos olhos da “sua vítima” e a magia acontecia. E ela considerava isso um superpoder que a tornava diferente dos demais. Contudo, com o passar dos anos, Clara foi perdendo o controlo sobre esse poder. Já não necessitava fixar as pessoas olhos nos olhos para ouvir os seus pensamentos. Seguia pelas ruas e ouvia um coro incessante de vozes: Como é possível continuar a trabalhar naquele escritório sombrio? Odeio o meu chefe! /Como abandonar aquele relacionamento tóxico?/Hoje, quando sair do emprego, tenho de ir às compras!/ Não suporto tanta gente neste comboio!... Vozes e mais vozes a todo o momento. Tristezas, felicidades, problemas, preocupações, alegrias. Tudo passava pelo interior da sua mente sem deixar espaço para um pouco de silêncio. E isso era exaustivo! Ela só queria a paz de ter minutos de silêncio na sua mente ensurdecedora! O pior, contudo, era essa faculdade estar sempre presente com os seus familiares e com os poucos amigos que tinha conservado desde que tinha perdido o controlo do seu “dom”. Percebera que o companheiro tinha muitos momentos em que preferiria estar sozinho no sofá do que na sua companhia. Descobriu que as amizades nem sempre eram tão sinceras quando aparentavam ser. Percebeu que atrás de um sorriso e de palavras doces se escondiam, muitas vezes, amarguras e tristezas de que preferia não ter conhecimento. Naquele dia acordou ao lado do companheiro. Um ligeiro sorriso e um “bom dia” entaramelado. Um pensamento fugaz passou pela mente dele: “está com péssimo aspeto…está a ficar velha. A idade não perdoa...” Clara sorriu e respondeu ao bom dia. Agiu de um modo natural, como todos os dias. Contudo, no fim da manhã, e sem que ninguém o previsse, despediu-se deste mundo, de um modo violento, deixando o corpo (e a mente) estilhaçados por um comboio…Não suportava mais viver com tantas vozes, com tantos pensamentos alheios na sua mente, com tanto conhecimento, negativo, sobre o outro… Seu comentário será publicado após ser aprovado.
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