LabE | Escrita Criativa
  • Serviços
  • Escrevemos Juntos
  • Artigos
  • Recursos
  • Contactos

O melhor conteúdo sobre escrita

Section divider type: curveAsym -- position: bottom

A vida do amolador de facas

1/31/2020

0 Comentários

 

conto e André Nunez, participante de workshop de escrita criativa

amolador de facas, conto, andré nunez, workshop de escrita criativa

O som acutilante espalhou-se por uma íngreme calçada portuguesa na transmutável Lisboa, e uma faca voltou a estar afiada. Numa sociedade em constante mudança, o som não tem uma origem percetível para todos. O som está perdido nos ouvidos de idosos em aldeias brancas com um banco de jardim que assinala o centro dessas localidades, onde amoladores de facas trilham caminhos que se estendem por vários quilómetros. Poder-se-á dizer que qualquer jovem até aos 35 anos só conhecerá este som se por alguma via um familiar ou colega possa ter escolhido essa melodia falaciosa como mero toque do smartphone. Mais propriamente, um toque de chamada associado a pessoas que disturbarão a paz interior por intensos minutos, algo muito possível.  Nesta calçada, o amolador especializa-se em facas de médio porte, tal como o pastor alemão que mora em frente e gane apenas face a este senhor.
            Não contando os cães da vizinhança, que decidem ganir por instinto face ao rodopiar dos seus pés na ferrugenta e feia bicicleta, este homem calado não apresenta sinais de violência. Por vezes nem leva recompensa pelo seu trabalho. Talvez por ser cada vez menos. Até existem facas descartáveis neste novo mundo.
            E ele lembra-se:
- Também as pessoas já são descartáveis.
            E ele relembra-se:
- Também ele já recai sobre a categoria de descartável. Preferia ser invisível. Preferia a categoria de ignorado. Nunca descartável.
            E ele relembra, como se tivesse a escutar o seu desaparecido pai:
- Nada faz melhor pelo negócio do que o medo.
            E as pessoas do bairro começaram a desaparecer. Não eram médicos ou advogados, mas outras pessoas consideradas descartáveis. Sem família, amigos ou legado. E sempre na conjuntura social em que algo criminoso fosse feito por uma minoria racial, ou pelo menos seria o que a polícia deduziria.  E assim as facas já não eram descartáveis. E ele também não. De amolador de facas passou a estilista, criando uma tendência bairrista do regresso de facas de porte médio, grande e maior. O medo instalou-se e facas começaram a ser usadas debaixo de colchões e até em sacos do pão, e uma sombra era o suficiente para estas serem retiradas com brutidão. Até o cão ter desaparecido. Com a sua substituição logo a seguir.
            Aqui pode-se inventar que o amolador enlouqueceu, porque quis continuar com a metáfora do descartável e matou-se para dar lugar a outra pessoa ou profissão. Mais do que acabar com tendências descartáveis, preferia o caos. Pode-se inventar também que era louco. Que enlouqueceu tal como o Rambo, um antigo combatente de guerra que foi maltratado pela sociedade. Com cicatrizes de guerra que não passarão. Mas a frase correta seria: tudo isto continuou até os cadáveres serem encontrados. Enrolados em trapos juntamente com facas de pequeno porte. Com marcas de cortes inúmeros e rápidos, demonstravam tortura e mortes dolorosamente lentas. Assim, o culpado foi encontrado.
            Mas tal como as facas descartáveis, também ele foi realmente substituído. E não tardou até o talhante empobrecido começar também com a mania de esfaquear durante a madrugada. Depois o barman quase falido. Depois o merceeiro falido. Até o peixeiro endividado. E é um mundo novo, que até tem assassinos descartáveis e tendenciosos.

0 Comentários

Vencedora do nosso desafio de escrita criativa

1/24/2020

0 Comentários

 

Memórias de uma bailarina, por Ana Paula Barbosa

desafio de escrita criativa, ana paula barbosa

"O vento já não é a minha companhia. Do calor agradável do sol, já não sinto o sabor. Das luzes, guardo memórias ténues de amarelo e vermelho riscadas. Trocaram a agitação tumultuosa dos camarins por uma vida involuntária. Ouço, ao longe, a madeira queixosa do palco, que amaciou todos os meus passos.
Escuto os dias, tic tac, tic tac, num compasso incessante. Dia e noite o repouso é o meu túmulo e o pó uma mortalha.

Uma pirueta invertida cessou os aplausos.
Sem retorno.
Sem descendência
".

0 Comentários

Desafio de escrita criativa

12/9/2019

0 Comentários

 
Desta vez, publicamos um texto de uma das participantes no desafio "30 dias de escrita criativa".
Parabéns, Carla Gonçalves!
desafio de escrita criativa, carla gonçalves
"Ela levantou-se, atarantada, uma sensação de peso no peito, desconfortável e sufocante. Iria tirar as cartas uma vez mais e aguardar. Depois de uma semana, não fazia outra coisa senão esperar. 
Sempre tinha ouvido a sua avó dizer que a vida era uma carta fechada. Mas ela teimava em abrir outras portas. Insista nos sinais, nas coincidências e déjà vues que ninguém mais reconhecia. 
As cartas vinham desvendando e confirmando esses sinais. Talvez não estivesse a colocar a questão certa. 
Voltas e mais voltas. 
Num ritual que imaginava ser o correcto, estendeu a toalha bordada a motivos indianos e de cores sombrias. Acendeu o incenso nag champ, hoje em dia vendido em qualquer drogaria. Baralhou as cartas, estendeu-as em meia-lua e escolheu cinco. Lince, falcão, esquilo, coiote, aranha. Liderança, minúcia, trabalho árduo, cilada, criação. 
A mesma incógnita de sempre e as respostas dúbias.
Raposa, búfalo, corvo, borboleta, rato. Astúcia, fé, magia, transmutação, detalhe?
Levantou-se decidida, apagou o incenso e arrumou as coisas. Tomou um duche rápido e vestiu-se com as melhores roupas. Preparou um chá só para ter o prazer de abrir o pacote e ler a mensagem espiritual. "It is not about the destination, it's about the journey".
Guardou a mensagem no bolso do casaco, despediu-se dos três gatos e chamou o elevador. Tirou, de novo, a mensagem que guardara no bolso. Desdobrou, releu, dobrou em quatro e voltou a guardar.
O sol brilhava e a rua estava deserta. Eram 11h da manhã. Sara olhou para a esquerda, olhou para a direita. Avançou com a perna esquerda e, quase no mesmo instante, olhou novamente e susteve a respiração. Viu mas já sem ver, tal foi o impacto da luminosidade. Um apito silvado no ouvido - piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. Interminável. 
"It's about the destination". Essa, seria sempre uma incógnita."

0 Comentários
<<Anterior
Reencaminhar>>

    Histórico

    Abril 2025
    Dezembro 2024
    Fevereiro 2024
    Janeiro 2024
    Outubro 2021
    Setembro 2021
    Outubro 2020
    Setembro 2020
    Maio 2020
    Abril 2020
    Março 2020
    Fevereiro 2020
    Janeiro 2020
    Dezembro 2019
    Novembro 2019
    Outubro 2019
    Setembro 2019
    Agosto 2019
    Julho 2019
    Junho 2019
    Maio 2019
    Abril 2019
    Março 2019
    Fevereiro 2019
    Janeiro 2019

    Categorias

    Tudo
    Autores
    Blogue
    Dicas Para Autores
    Entrevistas
    Exercícios De Escrita Criativa
    Livros
    Marketing Digital
    Passatempos
    Workshops

    Feed RSS

Laboratório de Escrita | Lara Barradas
Home | Serviços | Escrevemos juntos | Artigos | Recursos | Contactos
Termos de Serviço | Política de Privacidade
 © 2025 Laboratório de Escrita | Lara Barradas. Todos os direitos reservados.

Instagram | Facebook
Assina para receberes novidades sobre escrita criativa

  • Serviços
  • Escrevemos Juntos
  • Artigos
  • Recursos
  • Contactos